Brumadinho e Mitologia Afro: Nanã e Ogum

Todas as Culturas devem ser compartilhadas: tenho o privilégio de usufruir igualmente das sabedorias milenares judaica-cristã, grego-romana, chinesa, japonesa, indiana, egípcia, indígena, africana e TODAS tem muito a nos ensinar.

Tais conhecimentos são preservados pelos séculos por meio de histórias, mitos, lendas, envolvendo personagens fascinantes e enredos profundos e cativantes, pois simbolizam padrões comuns a toda humanidade, aos quais o Psicanalista Carl Gustav Jung nominou “Arquétipos”.

A recente tragédia de Brumadinho remete a algumas das mais antigas passagens contadas no continente africano e igualmente transmitidas no Brasil: as disputas entre os deuses Nanã e Ogum.

Artwork: Orixá Nanã - Artist: Henrique Vieira Filho
Artwork: Orixá Nanã – Artist: Henrique Vieira Filho Mixed technique – 23 x 31,5 inches African Mythology – Female Archetype – Great Mother – Mother Goddess – Goddess of wisdom, death and rebirth, rain and clay. – Artist’s gift to his wife, Fabiana Vieira Deusa da sabedoria, da morte e renascimento, da chuva e do barro Presente do Artista para sua esposa, Fabiana Vieira

Nanã é uma orixá feminina muito complexa, transitando entre os Arquétipos da Grande Mãe, do Ancião Sábio e da Morte.

Ela é quem se encarrega de reciclar a matéria por ocasião da morte: a volta ao barro, à argila da qual o ser humano foi moldado, libertando a lama das memórias da vida, para que possa ser matéria prima de novos renascimentos. Senhora das águas pluviais, defensora das tradições, independente, sábia, avessa à modernidade.

Por sua vez, Ogum personifica o Arquétipo do Guerreiro e é o senhor do metal, sem o qual os instrumentos “modernos” do caçador e heróis não existiriam.

Há mais de uma história de confrontos entre ambos, na vasta mitologia africana…

Em uma delas, Ogum, determinado em cumprir sua missão, segue irrefreável em seu caminho, sem se deter perante o pântano à sua frente.

A voz de Nanã o adverte que este território tem dono e ele deve respeito e pedir permissão para seguir adiante. O determinado guerreiro brada que não pede licença, e sim, conquista e avança, valendo-se de suas poderosas armas de metal. Sob o comando da anciã, por pouco o pântano deixou de tragar Ogum, que teve que lutar com toda sua força para escapar da lama.

“_ Você é poderoso, jovem e impetuoso, mas precisa aprender a respeitar as coisas” – ensina-lhe, Nanã…

Na recente tragédia em Brumadinho, pessoas em desequilíbrio com o Arquétipo do Guerreiro, violam a Natureza, em busca do metal para suas sagas modernas, sem a devida permissão e respeito aos limites ecológicos e técnicos.

Antes a lição/reação viesse de Nanã, que poderia ter sido mais condescendente…

Desta vez, não foi a Mãe Natureza que agiu: foi a própria lama da ganância e insensatez humana que transbordou, sem dó, nem piedade.

Henrique Vieira Filho é artista plástico, escritor, jornalista e psicanalista.

Sua experiência de décadas como terapeuta, em especial, com a Psicanálise Junguiana, lhe possibilita uma familiaridade ímpar com a mitologia e as imagens oníricas, sempre presentes em suas telas.

www.henriquevieirafilho.com.br

[email protected]

+55 11 93800-1262

]]>